A maneira (criativa?) de ver a criatividade

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Nota inicial: a propósito da celebração do Dia Mundial da Criatividade, no dia 21 de abril, aceitei o desafio do ComUM, jornal académico da Universidade do Minho, e partilhei algumas impressões sobre este fenómeno. Deixo, aqui, um conjunto de notas que deram forma às contribuições oferecidas.

Criatividade: uma luz que se acende ou um trabalho invisível?

Para melhor enquadrar as minhas opiniões sobre este fenómeno, penso que seria importante olhar para a forma como a sociedade, de forma geral, vê a criatividade e o criativo.

Sinto que ainda há quem pense que os criativos são seres iluminados, escolhidos para possuírem um dom excepcional – o dom de criar. Esta conceção de criatividade é, na minha perspetiva, bastante redutora e alienadora de pessoas que, como eu, não seguem o percurso expectável para ter sucesso nesta área. Ora vejamos: na Escola Secundária, fiz um curso no domínio das Ciências Naturais e Exatas e, devido às conceções genéricas associadas ao campo científico, sempre pensei que tal implicaria seguir um caminho profissional nesse mundo – um mundo (mais) pautado pela racionalidade, pelo método e pelo pragmatismo. Ainda assim, paralelamente a este pensamento, via, na escrita e na oralidade, uma espécie de escape que me permitia desprender das amarras desse tipo de visão mais restritiva.

Tinha, portanto, uma relação bastante ambivalente com a criatividade. Assumia, erroneamente, que certas características da minha personalidade me impediriam de ser criativa. O conflito entre estes dois modos de ver o mundo persistiu até ao momento em que, de forma quase paradoxal, decidi ingressar na Universidade do Minho, na Licenciatura em Ciências da Comunicação e, mais tarde, no Mestrado do mesmo curso, com especialização em Publicidade e Relações Públicas. As várias experiências vividas nestes cinco anos universitários – sejam curriculares, sejam extracurriculares – permitiram-me perceber que o que via como uma dicotomia poderia perfeitamente ser um binómio complementar.

Dessa forma, comecei a acreditar que a criatividade sem método e pensamento crítico e pragmático dificilmente poderia ser consequente. E foi neste momento que aprendi a olhar para a criatividade, não como algo absoluto, mas como uma das faces de uma mesma moeda. A outra face da moeda é, na minha perspetiva, a estratégia.

Tive a oportunidade de, na minha primeira experiência profissional, comprovar esta teoria. Desempenhei, durante quase quatro anos, o papel de gestora executiva do CreateLab, uma plataforma de Inovação e Experimentação, do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade, da Universidade do Minho. Neste laboratório, fui responsável pela gestão de uma equipa de estudantes, dos vários ciclos de estudos de Ciências da Comunicação e, juntos, demos resposta a vários desafios na área da Comunicação Estratégica, aplicando o princípio da criatividade estratégica (ou de estratégia criativa).

O sucesso desta plataforma e dos estudantes que dela fizeram parte dão mais força a esta minha convicção de que, talvez, esta seja uma forma mais abrangente – e, diria, saudável – de ver a criatividade. 

Criatividade: razão de ser e desafios em (re)vista

Na minha forma de conceber a criatividade – que, aceito, poderá não ser partilhada por todos os que trabalham nesta área – esta tem o papel de, em última instância, resolver um problema. E esse problema poderá ser de diversas naturezas – individual ou coletivo; objetivo ou subjetivo; consciente ou sugestionado. Independentemente do seu contexto, um problema poderá ser solucionado com uma abordagem diferenciada e devidamente fundamentada.

Na área profissional da Comunicação, sou muitas vezes confrontada com três grandes visões sobre a criatividade que, para mim, deixam antever três dos principais desafios inerentes ao processo criativo:

  • A primeira, mais otimista, defende que a criatividade é olhar para o que todos vêem e ver o que mais ninguém vê. O grande problema é que, atualmente, somos bombardeados com estímulos de diferentes índoles que, em última instância, nos limitam bastante a nossa visão;
  • A segunda, mais crítica e pessimista, defende que a criatividade nada mais é do que um remix de ideias prévias. Tenho a humildade suficiente para entender que muito já foi criado (e bem criado), mas conservo ainda a crença de que a criatividade pode estar, precisamente, na forma como essa conjugação de ideias é feita; 
  • A terceira, mais irrealista, defende que os diamantes (que, neste exercício de escrita, poderemos entender como trabalhos criativos) se fazem sob pressão. Sempre tive vários problemas com esta frase. Sim, as coisas podem ser feitas sob pressão. Mas sabem o que, invariavelmente, resta desta operação? A sensação de que algo melhor poderia ter sido feito. E esta sensação é muito difícil de gerir no âmbito do processo criativo.

Termino com a ideia que mencionei no primeiro tópico discutido e que pode ser, a meu ver, o principal entrave à criatividade: acreditar que a criatividade é algo reservado apenas para alguns. Todos podemos ser criativos, apenas precisamos de três elementos imprescindíveis: informação, tempo e confiança.

Criatividade: o processo (nada kafkiano)

O meu processo criativo

Tendo em conta a minha visão do processo criativo – amplamente explicado nos pontos anteriores – no centro do meu sistema de criação encontra-se outro conceito muito importante da Comunicação Estratégica: o benchmarking. É, para mim, fundamental olharmos para o que já foi feito numa perspetiva dupla de, por um lado, apresentar uma abordagem diferenciada que responda às lacunas encontradas e, por outro lado, que seja capaz de otimizar as oportunidades evidenciadas.

Para além deste exercício mais direcionado, se estivermos a falar de forma mais genérica, gosto muito de ouvir música que seja capaz de me posicionar num estado de espírito de maior confiança. Tenho, para o efeito, uma playlist de Spotify e aconselho que todos criem a sua própria.

Em casos de processos criativos partilhados, não prescindo de uma boa sessão de brainstorming. Continuo a acreditar que a reunião de uma equipa, num mesmo lugar, com a abertura e proximidade suficientes para ‘mandar ideias para a parede’ é a melhor forma de encontrar a solução.

Finalmente, também é importante relembrar que não somos máquinas. Muitas vezes, as ideias não chegam ou parecem fugir. Nesses casos, é preciso aceitar e, se possível, dar oportunidade ao nosso cérebro para trabalhar em backoffice. Muitas ideias surgem nos momentos mais inusitados e tenho várias experiências que podem comprovar isto.

Criatividade: inteligência artificial, real ou ambas? 

Falar de criatividade, nestes dias, conduz-nos invariavelmente ao ‘elefante na sala’, apelidado de Inteligência Artificial. Apesar de ainda não me considerar suficientemente versada no tema para dar uma opinião muito consistente, gostaria de relembrar que as inovações tecnológicas sempre trouxeram notícias de ‘mortes’ manifestamente exageradas.

Falo, por exemplo, dos vaticinados fins de meios de comunicação como a Rádio e a Televisão, com a chegada da Internet. Sim, há dificuldades, há perdas de audiência e perdas de receitas publicitárias. No entanto, em vez de diabolizar a Internet, estes meios foram capazes de lutar para se ajustar e manter a sua utilidade, aproveitando, precisamente, as funcionalidades oferecidas pelo próprio ‘bicho-papão’.

Sinto que poderemos trilhar caminhos semelhantes no que respeita à Inteligência Artificial e à Criatividade. Há formas de a Inteligência Artificial estimular a criatividade, diminuir trabalhos mecânicos e morosos, promover os devidos ajustes e melhorar o processo na globalidade? Pois, eu digo que é de se aproveitar! Contudo, importa não perder de vista que há coisas que a Inteligência Artificial nunca será capaz de fazer sem a Inteligência Humana. Recordo-me, a título de exemplo, de um enorme e criativo billboard, numa fachada de um prédio em construção, que dizia ‘Hey Chat GPT, finish this building…’

Estarei a ser demasiado otimista e crente na capacidade humana – duas características imprescindíveis para a criatividade? Talvez, mas vejo isso como algo intrínseco ao ser humano e, enquanto assim for, talvez fique tudo bem. Pode não concordar com tudo o que escrevi, mas se concordar com esta última premissa e acreditar que eu possa ser a pessoa para o seu projeto, vamos conversar!  

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